quarta-feira, 24 de março de 2010

[ Meu Doce Demônio ] Capítulo III

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- Capítulo III –


Depois de ter descoberto que aquela bolha de vidro estava realmente comigo, não larguei dela. Estava com medo de deixar ela caída em algum lugar, e acabar acontecendo algo ruim, como o que aconteceu no sonho. Estava com ela na escola, guardada no fundo da minha bolsa, só por precaução. Não queria que Ino e Hinata descobrissem sobre para evitar mais confusão e olhares preocupados.

Especialmente hoje eu tenho educação física – sim, eu tenho, mas são exercícios mais leves –, e teria que deixar minha bolsa sozinha na sala. Estava apreensiva de deixá-la longe de mim. Não sei, tinha a sensação de que devia cuidar daquele negócio estranho.

Não tinha muito como fugir; as pessoas iam achar pouco estranho se de repente eu aparecesse com minha bolsa no meio da educação física, claro. Sem alternativa, peguei apenas minha bombinha e me dirigi até onde os outros alunos estavam. Não sei se estava com um semblante normal ou preocupado, mas Ino e Hinata me olhavam de forma estranha até mesmo quando eu sorria.

Antes de sair do vestiário, fui até o espelho no intuito de prender meu cabelo. Não olhei diretamente para meu rosto enquanto penteava o cabelo, olhava apenas para meu cabelo. Só que, quando me veio a idéia de verificar se havia algo de estranho em meu rosto para a Ino e a Hinata estarem me olhando daquela forma, reparei que meus olhos estavam diferentes. Todo o contorno da íris estava com uma cor escura, contrastando com o verde vivo dos meus olhos.

Agora entendi porque elas fizeram aquela cara. Saí do vestiário e me dirigi á quadra. Estava sozinha, Ino e Hinata tinham ido na frente para ajudar a preparar a quadra. Não estava com pressa para chegar até a quadra, estava mais preocupada com aquela bolha de vidro que deixei na sala.

Será que se eu voltasse um instante para ver se estava tudo certo teria problema? Não... acho que não. Parei onde estava e me virei pra voltar. Dei alguns passos em direção à entrada para o corredor e assim que entrei e me virei em direção da minha sala senti um súbito arrepio. Olhei para fora da janela e, por entre as árvores ao fundo da escola pude ver um vulto negro.

O vulto movimentava-se numa velocidade impressionante e ia em direção da quadra onde estava minha classe. Sem pensar, comecei a correr em direção da quadra. Me senti tão angustiada. Lembrei do sonho que tive, e não pensei duas vezes, corri sem parar e sem tirar os olhos do vulto. Segurava firme minha bombinha, sabia que precisaria em breve.

Acho que ele percebeu estar sendo seguido e parou de se movimentar. Parei juntamente com ele e fiquei a observá-lo. Tentei encontrar os olhos do vulto, mas estava muito escuro. Tentei não me mexer muito para que ele não se sentisse convidado a se aproximar mais.

Pisquei os olhos e o vulto desapareceu.

- Corra – ouvi alguém sussurrar ao pé do meu ouvido, e me virei, dando de cara com aqueles olhos vermelhos.

Ouvi um rugido baixo à minha frente, e quando voltei meu olhar para o som, aquele monstro já estava a poucos metros de distância de nós. Só aí pude entender as palavras daquele homem, e pus-me a correr para longe.

Olhei para trás, e vi o monstro já em pedaços, sendo queimado por ele. Não parei de correr, continuei correndo até chegar à minha sala. Senti meu tórax doer – só aí me dei conta de que minha bombinha não estava mais comigo –, mas ainda andei alguns passos em direção da janela, e de lá tentei ver se ele ainda estava lá, mas não estava. As coisas voltaram ao normal. Era sempre assim, num instante as coisas pareciam estar completamente fora da realidade, e depois tudo voltava ao normal. Mesmo agora, mesmo em meu sonho.

Acabei passando mal com a falta de ar, e passei o resto do dia repousando na enfermaria. E, no final das contas, Ino e Hinata voltaram comigo para casa, e prometeram ficar comigo o dia todo para garantir que não teria mais nenhuma crise.

A tarde passou tranqüila. Fizemos apenas as tarefas escolares e comemos um lanche no meio da tarde. Ino e Hinata não tocaram mais no assunto dos monstros, e eu ainda sentia repulsa por não ter alguém que acreditasse em mim. Eu não tinha provas suficientes.

- Meninas... – comecei – Vocês não acreditaram no que eu disse ontem, não é? – estava de cabeça baixa, esperando suas respostar de descrença.

- Sakura... – Hinata suspirou – Mesmo que nós acreditemos, seríamos apenas nós. Fora que isso é muito irreal.

Ino permaneceu calada, como se consentisse com o que Hinata havia dito. Abracei minhas próprias pernas, apoiando minha cabeça em meus joelhos. Eu queria compartilhar minha loucura com alguém, mas seria egoísmo fazê-las passar por um ridículo igual ao que eu estou passando.

Olhei para fora da porta de vidro da pequena varanda do meu quarto. Já podia ver as ruas escuras e o céu tingido com as cores do pôr-do-sol quase extinguindo-se. Fiquei a contemplar a visão de lá de fora por algum tempo, enquanto Ino e Hinata conversavam sérias.

Fiquei imaginando o que tinha acontecido mais cedo, lembrando do semblante inexpressivo daquele homem, que, parando pra pensar agora, era realmente belo. Sua pele era tão pálida, em contraste com seus cabelos negros que caíam displicentes sobre seu rosto. Por um segundo, achei que o estava vendo do lado de fora da minha varanda, agachado sobre o parapeito da varanda, como um gatuno, quase completamente escondido pelas sombras. Mas, isso tudo era somente imaginação, ou sonho.

Só que esse sonho parecia mais real do que eu esperava. Ele me encarava com certa intensidade, e repentinamente saltou para o telhado. Foi aí que cogitei a idéia disso ser realidade. Arregalei os olhos, pensando na possibilidade.

Corri até a varanda, sendo acompanhada pelos olhares curiosos de Ino e Hinata, abri a porta bruscamente, afastando a cortina totalmente para o canto da porta, e passei para o lado de fora. Virei de costas para o parapeito, no intuito de vê-lo no telhado.

Sim, ele estava lá. Ino e Hinata se levantaram e foram até a porta, assustadas com minha reação repentina. Continuei a olhá-lo fixamente, com os olhos ainda muito surpresos.

- V-Você? – gaguejei.

Ele simplesmente estendeu o braço e me jogou algo, que descobri depois, ser minha bombinha. Ouvi um som de espanto por parte de Ino e Hinata – devem estar acreditando em mim agora, afinal, minha bombinha não pularia do telhado sem mais nem menos.

Ele voltou a saltar de volta para a varanda, ficando na mesma posição que o encontrei antes que saltasse para o telhado. Ele estava exatamente ao meu lado, olhando meus olhos com certa preocupação. Fiquei estática pela intensidade que ele me encarava.

- Você está com uma pedra, não está? – acenei positivamente. Olhei de relance para Ino e Hinata, vendo-as pasmas e intimidadas com a presença dele.

- Sim – respondi simplesmente. Vi-o descer do parapeito e entrar sem cerimônia dentro do meu quarto.

Ino permaneceu estática, olhando para ele, enquanto Hinata deu alguns passos para trás, buscando apoio. Ele passou por elas sem sequer fitá-las, buscando com os olhos a pedra, provavelmente. Segui até onde ele estava, receosa.

- Onde está? – perguntou, retirando sua espada da bainha. Recuei alguns passos, assustada.

- Dentro da minha bolsa – apontei.

No instante seguinte ele já havia pegado a pedra de onde estava e a jogou no chão. Me senti sendo puxada por ele para onde a pedra estava, não relutei. Ele puxou uma de minhas mãos e, com a espada, fez um pequeno corte na palma da minha mão. Fechei os olhos sentindo dor, mas não emiti som nenhum.

Senti-o soltar minha mão e abri os olhos, vendo sua espada fincada na bolha de vidro, junto com meu sangue. Um líquido transparente saiu de dentro da bolha, manchando o carpete do meu quarto. Meus olhos arderam por um instante. Ele retirou sua espada da bolha e segurou meu rosto, certificando-se de algo em meus olhos. Guardou a espada em seguida, e, antes que eu pudesse reagir, ele havia me beijado, e o gosto de sangue que senti no sonho foi sentido novamente, só que desta vez, real.

Depois de se separar de mim, ele pegou minha mão que ele mesmo havia cortado e a curou com um simples toque. Olhei-o, corada.

Sem dizer mais nada, ele largou minha mão e saiu em direção da minha varanda. Corri em sua direção, estava curiosa com o que havia acontecido, e ele não meu pareceu tão perigoso quanto antes.

- Espera! – gritei – O que está acontecendo? Quem é você? O que é isso tudo? – ele hesitou um instante para responder, ainda de costas para mim.

- Sasuke.

- O que?

- Meu nome – ele me olhou por cima do ombro e completou – Sou o último demônio do Japão – pausou – Isso é tudo.

No instante seguinte ele já havia desaparecido. Caí sentada, ainda digerindo o que ele havia dito. Um demônio? Impossível.

Senti uma mão pousar sobre meu ombro e me virei bruscamente, assustada. Era Ino. Ela estava tão assustada quanto eu, mas ainda estava consciente, ao contrário de Hinata, que chorava silenciosamente, com medo.

- Sakura... Eu nunca mais vou duvidar de você – comentou Ino, sentando-se ao meu lado.

...

Depois de tudo aquilo, a Hinata teve que ligar para os pais dela virem buscá-la, porque estava atordoada demais para voltar para casa sozinha. Ino foi sozinha para casa, ainda um pouco assustada.

Dormi assim que ambas foram embora da minha casa, e sequer me dei ao trabalho de jantar, de novo. Apenas fui dormir.

Não sonhei com nada muito específico, mas durante meus sonhos, pude ver a face dele, Sasuke, acho que é esse seu nome. Lembrei também de seu beijo, esse fora real. Eu nunca sequer imaginei que um dia poderia me imaginar beijando um demônio, que, aliás, não lembrava nem um pouco os demônios da mitologia japonesa. Ele era simplesmente lindo demais para ser um demônio.

...

Desta vez, a Ino repetiu a mesma coisa que fez no dia anterior, me acompanhando até a escola. Geralmente ela acordava mais cedo, mas de vez em quando ela “sentia uma vontade incontrolável de conversar” e vinha comigo para a escola. Eu nunca achei ruim, pelo contrário, era agradável escutar as baboseiras dela logo pela manhã, eu me divertia muito.

- Então, Sakura – ela começou enérgica. Parece que já havia se conformado com o que aconteceu ontem – Sabe, o que aconteceu ontem foi realmente assustador, na hora.

- Na hora? – perguntei, perplexa.

- É. Porque, se você for parar pra pensar, ele podia ter te matado assim que ele chegou na sua casa, mas ele trouxe a sua bombinha, o que eu achei bem estranho, e ainda te deu um beijo e curou o corte que ele mesmo fez na sua mão. Fora que, eu não imaginava alguém tão bonito, pelas descrições que você fazia – eu ri, ouvindo as coisas absurdas que Ino falava – Mas agora é sério... Se ele realmente existe, então os monstros que você falou também existem, certo? – agora ela estava séria.

Eu apenas acenei afirmativamente, entendendo seu medo. Eu estava com tanto medo ultimamente, que nem sabia como consolá-la, só podia entendê-la e esperar que nada de pior acontecesse.

Depois de ter tocado no assunto do beijo, eu voltei a relembrar o momento, pensando no por que dele fazer aquilo quando eu estava com algum problema físico. E aquele gosto de sangue? Será que aquilo era um feitiço, magia, maldição... Sei lá, essas coisas estranhas. Não esperava nada normal, de qualquer forma.

Andei por um bom tempo só escutando o que Ino dizia. Escutando não escutando, na verdade. Como sempre, me perdia em meus devaneios. Ainda mais agora que o mundo resolveu virar de cabeça pra baixo, e os únicos momentos que eu acreditava serem propícios para refletir eram interrompidos por algo inconveniente que acontecia. Até em sonhos eu acabava sendo perturbada.

- E o que aconteceu com aquele negócio estranho que ele espetou com a espada? – Ino me cutucou, para que prestasse atenção.

- Ah, eu guardei em uma caixa e lacrei. – Ino chegou bem perto do meu rosto e ficou observando meus olhos – O que? – perguntei, me afastando.

- Depois que ele fez aquilo, os seus olhos voltaram ao normal. – de repente minha ficha caiu. Era por isso que ele olhava tanto pros meus olhos.

Aos poucos eu me via descobrindo tudo o que não entendia, mas grande parte de minhas dúvidas ainda permaneciam praticamente sem resposta. Talvez eu não devesse saber mais, ou até mesmo nunca tivesse que entrar nesse mundo que eu nunca, sequer cogitei a idéia de existir. Ainda mais vinculado com o mundo real. É, filmes eram só filmes...

- Ino – chamei-a novamente – Tenho que te contar uma coisa, mas acho melhor não contarmos nada para a Hinata, pra evitar maiores sustos. Ela já deve estar bem abalada.

- Pode contar – incentivou.

- Bem... Ontem, o Sasuke foi me devolver minha bombinha porque, mais cedo, um monstro havia aparecido na escola, e eu acabei deixando minha bombinha cair no meio do lugar em que ele e o monstro estavam... lutando, sei lá.

Reparei na falta de reação da Ino e fiquei um pouco alarmada. Não queria que ninguém fizesse nenhum escândalo sobre isso. Já estava sendo difícil demais para três pessoas viverem com essa realidade tão assustadora, envolver mais pessoas na mesma situação seria quase maldade.

Ino juntou ambas as mãos em frente ao corpo, em sinal de nervosismo, enquanto eu esperava silenciosamente por seu comentário, que veio mais breve do que esperava.

- Isso deixa as coisas um pouco mais perigosas. – finalizou.

Permanecemos em silêncio até chegar à escola, cada uma pensando sobre outras soluções plausíveis para acabar com aquele tormento, mas nenhuma das soluções estaria ao nosso alcance. Quem sabe se fôssemos mais úteis...

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